
Muita gente me pergunta pela Doidivanas. Para quem está se aprochegando agora, a banda é um projeto musical de fusão do rock com regionalismos gaúcho e latino-americano, com o qual lancei três álbuns – Liber Pampa (1998), Viagem ao Sul da Terra (2002) e Nosotros (2008) – e o EP e histórias em quadrinhos – Doidivanas e Libório (1999), parceria com o cartunista André Macedo, o Alma.

O disco vinha junto com um gibi, no qual fomos transformados em personagens de quadrinhos. Para o CD criamos uma música para o personagem Libório.

O pessoal quer saber onde escutar as músicas, se vamos lançar outros discos e tal. A questão é que nosso site está fora do ar (há alguma canções mofando no Myspace) e, desde 2009, decidimos dar um tempo no projeto para nos dedicar a outras atividades artísticas e profissionais.
Por isso, decidi publicar a minha coletânea da banda no SoundCloud: a Doidivanas, The Best of The Rock Bagual. Uma seleção do que considero mais significativo, curioso, inovador ou, simplesmente, pela minha predileção.
A Doidivanas gravou cerca de 50 músicas nos quatro discos. Do material inédito, temos outras 30 em registros em demos, gravações de ensaio e coisas antigas e, ainda, umas 20 compostas, sem registro em estúdio, com letra e música. Somando tudo, mais de 100 trabalhos criados em uma década. Algumas destas composições estariam em um futuro álbum da banda, que estávamos chamando provisoriamente de Próximos Distantes. É possível escutar duas músicas deste acervo no álbum solo que o cantor Felipe Mello está lançando neste ano: o projeto Aeroflip.

A ideia principal da banda foi criar pontes entre a cultura regional gaúcha e outros estilos musicais contemporâneos, principalmente, o rock’n’roll. Aproximar gêneros e tribos. Mesclar estilos e ritmos. Funk com vanerão. Metal com chamamé. Xote com reggae. Folk rural. Rock bagual ou rock gaudério. Olhando em retrospecto, o trabalho tem seus altos e baixos, com apostas em várias direções, transformando-se com o passar dos anos, amadurecendo junto com a gente. Mas o que as músicas podem ter de inconsistência sobra em espírito juvenil, bom humor, lirismo, sátira, melancolia e experimentação.

Um pouco de história. A banda nasceu em Pelotas, em 1995, com os amigos Rodrigo Osório, no baixo, Daniel Conceição, guitarra, Felipe Mello, vocal, Daniel “Cuca” Moreira, violão e voz, Fernando “Bizo” Silva, teclado e harmônica, e comigo, na bateria. Posteriormente, a banda se estabeleceu como um quarteto, com a saída com Bizo e do Cuca (que se manteve como quinto doidivanas, criando o projeto gráfico de todos os discos, editando videoclipes etc), trabalhando com vários instrumentistas e compositores.

Tínhamos influências diversas, que iam de bandas como Red Hot Chili Peppers, Living Colour, Pearl Jam e Faith No More a grupos de rock brasileiros dos anos 90, Chico Science e Nação Zumbi, Raimundos, a referências de sons do sul do Brasil, do pop, rock, MPB e nativismo, como Almôndegas, Engenheiros do Hawaii, Vitor Ramil, Nei Lisboa, Kleiton & Kledir, Mano Lima, Cenair Maicá, entre outros. O caldeirão regional e universal que moldou o conceito híbrido da banda.

Uma das características sonoras mais marcantes é o uso da gaita (ou acordeon, como chamamos aqui no sul), instrumento bastante identificado com a música regional gaúchos, junto com o punch do rock. Trabalhamos com gaiteiros como o Luciano Maia e o Mano Júnior, ainda bem novinhos na época, e com meu irmão, o multiinstrumentista João Marcos Negrinho Martins. A guitarra pesada. Alternância de ritmos. Solos ou levadas de gaita. Grooves do funk-metal. Arranjos com percussões da região como o bombo leguero, oriundo da Argentina, e o sopapo, herança da cultura negra, tocadas pelo mestre Jucá de Leon. A brincadeira poética com frases e dizeres gaúchos. Referências pop e do folclore. Um leque de possibilidades que nos permitiu transitar e interconectar universos musicais e artísticos.
Um dos lances bacanas de tocar em uma banda é a possibilidade de viajar e conhecer pessoas e lugares. A Doidivanas tocou em diversos bares, feiras e projetos no Rio Grande do Sul – Musicanto, Moenda da Canção, Cabobu, RodaSom -, no festival Rock’n’Halls, em São Paulo, e fez intercâmbio cultural com os hermanos no festival de folclore de Minas y Abril, no Uruguai.

A banda se manteve sediada em Pelotas, interior do estado. Mas sempre batalhamos muito para alcançar repercussão para o trabalho, com relativo sucesso no Rio Grande do Sul, principalmente entre 1998 e 2002. A Doidivanas encontrou espaço em mídias do estado, com entrevistas e reportagens em revistas, jornais, TVs e rádios. Algumas oportunidades em nível nacional. Gravamos um comercial para TIM, em 2005, e participamos, por exemplo, do quadro Novo Som do Brasil, no Jornal Hoje, da rede Globo, em 2002.
Nesta trajetória da Doidivanas, pudemos estar lado a lado com músicos, artistas e bandas que éramos fãs e admiradores. Para citar alguns: Acústicos e Valvulados, Nenhum de Nós, Bebeto Alves, Nelson Coelho de Castro, Edu daMatta, Ultramen, Frank Jorge, Maria do Relento, Bataclã, Irmãos Rocha, Replicantes, Tom Bloch, Hique Gomez e Nico Nicolaiewsky, do Tangos e Tragédias, Giba Giba, Luizinho Santos, Angelo Primon e inúmeras outras figuras talentosas. Também eternos agitadores da indústria musical, como Ayrton dos Anjos, o Patineti. Jornalistas como Juarez Fonseca, Arthur de Faria, Gilmar Eitelwein e Paulo Moreira, e os produtores culturais Dedé Ribeiro e Alexandre Barreto. São pessoas que reencontramos em inúmeras ocasiões ao longo dos anos. Muitos acabam se tornando amigos, colegas de trabalho ou colaboradores em projetos.

Além do laboratório criativo, a Doidivanas é um projeto que tenho muito apreço, pois foi onde pude crescer como artista e profissional da cultura, como baterista, letrista, compositor, produtor executivo, produtor cultural, assessor de imprensa e divulgador.
Também é uma oportunidade de conhecer profissionais e artistas que atuam no mercado musical. Promotores de shows, donos de casas de show, empresários, agentes, agitadores e produtores culturais, pessoal de gravadoras e editoras musicais, compositores, arranjadores, produtores musicais, jornalistas, radialistas, apresentadores de programas de rádio e de TV, publicitários, repórteres, fotógrafos, blogueiros, cineastas, artistas visuais, publicitários, divulgadores, roadies, diretores de palco, técnicos de som e iluminação, entre outros. Uma grande forma de trocar experiências, criar uma rede e ampliar conhecimento.
Bueno, sem mais delongas, aqui começa a coletânea. Boa diversão!
DOIDIVANAS – THE BEST OF THE ROCK BAGUAL
#01 – BALADA BOVINA (Liber Pampa, 1998) – MP3 e letra no SoundCloud.
O ponto de partida desta misturança foi a composição da Balada Bovina, em 1996. Uma divertida mescla de rock, funk e vanerão sobre um controvertido romance nonsense entre um homem e uma vaca, com ditados bem gaudérios. A música participou do festival Moenda da Canção, em Santo Antônio da Patrulha (RS). Foi onde tudo iniciou. A canção que deu início à série.
Participação especial de Luciano Maia, no acordeon.
#02 – XOTE DE XERIFE (Liber Pampa, 1998) – MP3 e letra no SoundCloud.
O que acontece quando a Jamaica encontra o Rio Grande do Sul? Um xote-reggae. Bob Marley na bailanta dançando agarrado em uma prenda. Em uma praia qualquer do mundo, um gaúcho bem tradicionalista começa uma amizade com um certo artista do reggae. Apesar do estranhamento inicial, os novos amigos encontram afinidades entre os ritmos, algumas cores das bandeiras e experiências com ervas. Desta mistura entre culturas surge o Xote de Xerife (pelo menos, foi o que o gaudério entendeu).
Música incidental “I Shoot the Sheriff“, de Bob Marley. Participação especial de Luciano Maia, no acordeon, e Luciano Mello, no sequencer.
#03 – É O RETOÇO (Liber Pampa, 1998) – MP3 e letra no SoundCloud.
Na segunda metade dos anos 1990, certo grupo de pagode e axé fez um tremendo sucesso no Brasil e mundo com divertidas canções de duplo sentido e dançarinas com atributos físicos, digamos, abundantes. Sim, eu estou falando dos baianos É o Tchan!, projeto capitaneado pelos vocalistas “Cumpadi” Washington e Beto Jamaica. Pois, ficamos muy intrigados em compreender tal fenômeno pop. Daí, filosofamos: qual seria a versão da gauchada para tal gênero artístico-musical?
“É o Retoço” foi a nossa resposta/homenagem/paródia para É o Tchan! (piada que poucos captaram na época). Partimos de um riff de guitarra e baixo, criado pelo Osório e Con6, para compor um rock-milongão-vaneira sobre uma nova dança “encrenqueira que escancara as fronteiras”, recomendada “pros velhos e pros moços”, para inspirar a “gurizada ficar num alvoroço”.
E não. Infelizmente, não chegamos a inventar uma coreografia bombástica para a música. Apesar de inúmeros esforços da banda, na época, não conseguimos cooptar nenhuma prendinha que se arriscasse a competir com o rebolado da Carla Perez. Uma pena… Teria sido muito divertido!
Participação especial de Jucá de Leon, na percussão, Luciano Maia, no acordeon, e Edison Macuglia, nos violões e guitarra “retoceira”.
#04 – NÓIS RÉVI METAL (Liber Pampa, 1998) – MP3 e letra no SoundCloud.
Nóis Revi Metal é um pornô-funk-metal-vaneirão. Um bem-humorado coquetel musical que mistura bandas desbocadas e experimentais que curtíamos na época – como Velhas Virgens, Graforréia Xilarmônica e Mr. Bungle (outros dos muitos projetos do Mike Patton, vocalista da Faith No More) – com doses cavalares de ditados gauchescos (repleto de estereótipos machistas e nada politicamente corretos) e inconsequência juvenil.
A “primorosa” letra fala de um apimentado caso entre um gaudério e sua caliente e arredia prenda. Certamente, é uma das coisas mais divertidas (e sem noção) que já escrevi.
Vale ouvir, aos 1’30” da faixa, a escala impossível que o acordeonista Luciano Maia enfiou no arranjo. Participação especial do já citado Maia e de Edison Macuglia, no violão.
#05 – SAMBA DO ARNESTO (Liber Pampa, 1998) – MP3 e letra no SoundCloud.
Rock bagual e samba. Guitarra, acordeon, cavaco, pandeiro e tamborim. Para incrementar o caldeirão musical do álbum Liber Pampa, sentimos que faltava um tempero brasileiro.
Eis a releitura da Doidivanas para o clássico do grupo Demônios da Garoa, composta, em 1952, pelo genial sambista paulista Adoniran Barbosa. Um tesouro da música popular brasileira.
Nesta versão, nos atrevemos até a uma declamação gaudéria e, quase ao final da faixa, colocamos uma pegada rock hardcore. Gurizada maluca!
Participação de Luciano Maia, no acordeon, Edison Macuglia, violões e cavaco, e Jucá de Leon, maracas, agogô, tamborim, apito, surdo e pandeiro.
#06 – TREM NO POMAR (Liber Pampa, 1998) – MP3 e letra no SoundCloud.
#07 – ALÉM DOS QUINTAIS DO RANCHO (Liber Pampa, 1998) – MP3 e letra no SoundCloud.
#08 – DOIDIVANAS (Liber Pampa, 1998) – MP3 e letra no SoundCloud.
#09 – SANGRIA (Liber Pampa, 1998) – MP3 e letra no SoundCloud.
#10 – ANOS NOVENTA (Liber Pampa, 1998) – MP3 e letra no SoundCloud.
Grande Doidivanas, inovando, mesclando e ousando. Foi um prazer conhecer os caras, gravar no Estúdio que tinham na Tamandaré, onde fizemos as primeiras gravações da Banda Psico & descobrir um parentesco ( não tão distante com o Dmart), abraços à todos e Bonna Fortuna!!
Boa noite, parabéns pela postagem, curto muito Doidivanas e essa postagem vai me ajudar a matar a saudade! Mas eu gostaria de ouvir a ” Sou de Pelotas porque?”, por acaso tens como postá-la? Eu tinha aquele CD, autografado pela banda, mas perdi em uma mudança. Abração.
salve, Junior! obrigado pela curtição. o EP Doidivanas e Libório será o próximo álbum a ser publicado. baitabraço, dMart.